Conferências e fontes de artigos científicos

Conferências e fontes de artigos científicos

Uma curiosidade que eu sempre tive na minha época de estudante era de como os professores se atualizavam com o estado da arte da literatura na qual eles eram ao mesmo tempo escritores e leitores.

Durante a minha jornada perguntando para muitos mestres e doutores mundo afora, eu cheguei na conclusão que cada pesquisador(a) tem um método específico e único que atende diversos critérios de tempo, disposição, acesso, agenda acadêmica, e até mesmo momento de vida.

Mas por quê se atualizar?

Eu uso o meu pequeno canal Artigos de ML como uma forma de refinar o meu conhecimento sobre algum assunto que eu tenha uma genuína curiosidade intelectual de saber mais sobre. Isso me dá muita liberdade para pensar em coisas que estejam fora do ciclo de notícias ou hype.

Isso sem contar que eu não tenho nenhum tipo de agenda acadêmica para preencher o que eu particularmente gosto e acho libertador do ponto de vista intelectual, pois eu consigo deixar com que a minha curiosidade me guie durante um processo menos estruturado de auto-aprendizado.

Por mais que seja incomum para alguém que está na indústria, eu gosto de me atualizar via literatura acadêmica por uma série de razões:

Camisa de força intelectual do mundo corporativo: Como eu estou no mundo corporativo, muitas das vezes o aprendizado via prática se torna um fator limitante no meu processo de entendimento do ponto de vista da rigidez de experimentação. São poucos lugares em que erros são vistos como aprendizado ao invés de prejuízo. Grande parte dos trabalhos científicos não tem essa limitação de forma tão grave pois existe liberdade para entendimento da teoria e aplicação da prática de forma sistematizada e científica;

Sair do off-road corporativo e ir para a pista de Formula 1 no aspecto metodológico já na metade da corrida: Dependendo da pesquisa, um caminho inicial para uma solução já foi criado e validado de forma sistemática e com a exposição de potencialidades e limitações.

Eu particularmente não gosto de acompanhar os resultados dos artigos (por conta de viéses de confirmação, congruência, expectativa observacional, efeito chamariz, percepção seletiva, e reflexo de Semmelweis ) mas sim os métodos que esses artigos trazem e como eu posso aplicar isso no meu dia-dia.

Graças a essa forma de exploração prévia eu comecei a utilizar algumas técnicas como Bag of Tricks em NLP, métodos de boosting escaláveis ainda no final de 2016, e arquitetura de convolução de visão computacional com separação de bloco de convolução em 2017;

A contraparte disso no mundo corporativo são todos os vieses descritos acima, misturados em um lamaçal de nonsense, pressões corporativas diversas, e a utilização errônea de instrumental como testes A/B em um monte de experimento sem sentido movido apenas por ego de chefes.

  1. É um tipo de literatura que me coloca em contato com o estado da arte, as potencialidades e limitações do
  2. meu campo do conhecimento; contato esse me ajuda a ser um profissional melhor informado em relação à prática e a teoria;

  3. Dependendo do grau de maturidade de uma determinada área eu consigo ter um panorama geral de como navegar
  4. profissionalmente dentro do meu campo de interesse de uma forma mais consciente e informada.

Aqui neste item 4 é onde eu vejo muita gente trocando os pés pelas mãos. Eu conheço Cientistas de Dados e Engenheiros(as) de ML que são muito talentosos ficando “enjoados” de algo específico dentro de um campo de ML e aí vão pular para algo totalmente não relacionado, como “front-end” ou “gestão” em que são habilidades úteis no mercado de trabalho moderno, mas que têm um grau de transitividade baixo entre si.

Eu quero escrever sobre isso um dia, mas em suma ter uma porçâo de qualidades não relacionadas vai apenas diluir o tempo para o alcance da maestria em um tópico (que no final do dia é a fortaleza que o profissional precisa) como não vai gerar o efeito composto (ou bola de neve) em que habilidades subjacentes fazemem uma carreira a longo prazo.

O que ler?

Essa é a pergunta mais importante de todas, pois o tempo é finito e cada dia milhares de artigos são publicados.

Eu não tenho uma resposta simples para isso, dado que depende do momento acadêmico e profissional de cada um, mas o que eu tenho para mim é um critério que eu levo em consideração duas dimensões que são (i) a intensidade do momento (pode ser profissional, pessoal ou ambos) e (ii) necessidade de leitura.

a) Baixa intensidade sem necessidade de leituras críticas Aqui eu pratico indulgência intelectual propriamente dita. Eu leio o que me interessa sem nenhum tipo de critério específico. Algumas leituras vão desde desenvolvimento bilinguístico de crianças na primeira idade e das questões cognitivas envolvidas, como a maioria dos achados científicos médicos são falsos, e como desabafos e reclamações no geral, também conhecidos como venting não funcionam e como isso está empurrando as pessoas para estados de insatisfação permanente e até mesmo agressividade.

b) Alta Intensidade sem necessidade de leituras críticas. Aqui eu dou uma pausa nas leituras que demandam mais reflexão, mas sempre estou olhando algo mais recente apenas para “saber o que está acontecendo”, mas nada que vai tirar o meu foco no momento atual.

c) Baixa Intensidade com necessidade de leituras críticas. Esse estado é quando eu sei que algum projeto interessante está chegando no horizonte e que vai demandar ou uma atualização em algo que eu estou praticando a muito tempo ou se eu vou liderar algum esforço coletivo de implementação o qual vai demandar que eu me comunique com múltiplas pessoas. Um exemplo foi quando eu tive que trabalhar em um projeto de visão computacional em que eu tive que atender requerimento de desempenho de algoritmo (i.e. Recall no top@5 acima de 90%), desempenho de sistema (i.e. tempo de resposta abaixo de 50ms) em que eu tive que ler muitos artigos para chegar em algo satisfatório e explicar isso para cientistas de dados + PO + SysAdmins + Operações com o racional da escolha.

d) Alta Intensidade com necessidade de leituras críticas: Neste tipo de situação eu dou uma pausa em algumas atividades

Onde ler?

Tem gente que lê melhor no trabalho para fazer um melhor uso do tempo profissional, tem pessoas que gostam de ler em situações de espera que eu chamo de buffer, tem pessoas que tem um lugar específico para ler como o próprio escritório pessoal ou ao ar livre.

Pessoalmente eu gosto de utilizar situações de espera para as minhas leituras.

E aqui vale tudo: Corrida no Uber, sala de espera de aeroporto, voô, ônibus. Esses tipos de situações geralmente são momentos “mortos” em que grande parte das vezes a socialização não vai acontecer mesmo, e o tempo vai ser perdido de qualquer maneira; então eu tento capitalizar em cima nesses momentos.

Contudo, eu tenho um dia específico da semana em que eu faço as minhas leituras e é algo que pra mim é algo que eu tento manter uma consistência quase que religiosa. Faça chuva faça sol eu vou ler nesse dia da semana, nem se for por 25 minutos. Eu já fiz leituras em sala de delegacia, festa de aquecimento para casamento, salão de espera de maternidade, durante vigilia noturna de funeral, no meio da praia, e em festa de aniversário de criança!

A minha inspiração para isso veio totalmente do Jerry Seinfeld e o seu método chamado “Não quebre a corrente”.

Isso me ajuda a criar um hábito de uma maneira simples e para manter a disciplina é muito simples. Independentemente do meu estado de espírito ou disposição eu vou ler nesse dia da semana.

Eu definitivamente não recomendo uma agenda tão restrita quanto essa devido ao fato de que isso demanda um entendimento familiar e social muito alto dependendo da relação.

Conferências

Eu tenho uma separação bem clara das conferências em níveis. E aqui eu não coloco em termos qualitativos em si, mas por um grau de prioridade em termos de leitura e acompanhamento. Eu não sigo índice H ou qualquer tipo de lista pré-construída pela comunidade acadêmica, devido ao fato de que eu tenho interesses distintos.

Atualmente eu tenho 3 níveis:

Nível 1 Eventos os quais eu acompanho ativamente as datas e no momento que os proceedings são divulgados eu já tento ler o mais rápido possível se for algo relacionado ao trabalho ou alguma pesquisa pessoal. Na maioria das vezes vão ser periódicos com trabalhos mais aplicados.

Nível 2 Esses eventos são aqueles que têm uma relevância relativamente alta no mainstream e
que tem boas linhas editoriais. Eu tento acompanhar na medida do possível.

Nível 3 Aqui são todos os outros em que eu pesquiso somente algo realmente acionável ou alguma ideia interessante que acabou passando batido nos níveis acima. Tem alguns periódicos mais de áreas adjacentes ou teóricos.

Importante salientar que esses são critérios muito pessoais e que eu demorei um tempo para chegar nesses critérios.

Um exemplo disso é que óbvio que a NeurIPS e a CVPR são as melhores conferências dentro de Deep Learning e Visão Computacional, mas no meu caso grande parte dos trabalhos que saem lá no meu critério são muito mais informacionais (SOTA, etc) do que algo que eu posso usar no dia-dia como a RecSys em que toda edição eu tenho uma tonelada de papers para revisar pois impacta diretamente o meu dia-dia.

E os eventos de mercado?

Com o esvaziamento técnico dos eventos da InfoQ e com o fim dos eventos da O’Reilly, os eventos de mercado que mais me interessam os da Linux Fundation; em especial a Kubecon.

Mas pessoalmente eu confesso que cada dia menos eventos me chamam a atenção, mas isso é tema para outro post.